A Nova Escola de Sargentos e os 150 hectares a serem desmatados vêm se somar a tantas agressões ambientais que a APA Aldeia-Beberibe tem sofrido nos últimos anos com os mini-desmatamentos provocados pelas residências e condomínios que só aumentam em Aldeia. Se a gente visita um condomínio antigo e um condomínio novo, vê claramente a diferença de como a natureza está sendo tratada em Aldeia. Nos antigos, são casas dentro da mata. Agora são extensas áreas desmatadas, “deixando” uma pequena fração isolada de vegetação arbórea, dividindo a cobertura original da região em pequenos fragmentos sem conexão, isolados por muros altos que impedem a circulação de animais terrestres.
Animais que são mortos por atropelamento ou por invadir as casas construídas nas áreas desmatadas. São consequências da ideia que a “minha” árvore eu preciso derrubar, mas a do outro é crime ambiental, conceito que devemos ter cuidado ao analisar.
Se analisarmos a legislação brasileira, considerada de excelência, veremos que os empreendimentos podem ser instalados na APA, desde que sejam cumpridos os condicionantes normativos.
As legislações federal e estadual são claras: se tem que desmatar, tem que fazer estudo ambiental e compensar com reposição da vegetação erradicada.
Quanto à localização na APA Aldeia-Beberibe, a Lei Federal 9.985/2000 estabelece em seu Art., 36, §3o: “Quando o empreendimento afetar unidade de conservação específica ou sua zona de amortecimento, o licenciamento a que se refere o caput deste artigo só poderá ser concedido mediante autorização do órgão responsável por sua administração e, a unidade afetada, mesmo que não pertencente ao Grupo de Proteção Integral, deverá ser uma das beneficiárias da compensação definida neste artigo.
Quanto ao desmatamento no Bioma Mata Atlântica, a Lei Federal 11.428/2006 que dispõe sobre a utilização e proteção da vegetação nativa deste bioma estabelece no Art. 12: “Os novos empreendimentos que impliquem o corte ou a supressão de vegetação do Bioma Mata Atlântica deverão ser implantados preferencialmente em áreas já substancialmente alteradas ou degradadas” e, no Art. 17: “O corte ou a supressão de vegetação primária ou secundária nos estágios médio ou avançado de regeneração do Bioma Mata Atlântica, autorizados por esta Lei, ficam condicionados à compensação ambiental, na forma da destinação de área equivalente à extensão da área desmatada, com as mesmas características ecológicas, na mesma bacia hidrográfica, sempre que possível na mesma microbacia hidrográfica, e, nos casos previstos nos Arts. 30 e 31, ambos desta Lei, em áreas localizadas no mesmo município ou região metropolitana”.
As condições de autorização de corte e a supressão da vegetação primária do Bioma Mata Atlântica estão excepcionalmente condicionadas a projetos ou atividades de utilidade pública, pesquisas científicas e práticas preservacionistas (Art. 20). Considerando a escola como de utilidade pública, os empreendedores deverão obedecer ao disposto no art. 14 desta Lei, ou seja, “caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto”, além da realização de Estudo Prévio de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA).
Em termos de legislação estadual, a Lei Nº 14.249/2010 estabelece no Art. 7º: “O licenciamento ambiental para empreendimentos e atividades considerados efetiva ou potencialmente causadores de significativa degradação do meio ambiente dependerá de prévio Estudo de Impacto Ambiental – EIA e respectivo Relatório de Impacto Ambiental – RIMA, aos quais se dará publicidade, garantida a realização de audiências públicas, quando couber, de acordo com a regulamentação”. (Redação alterada pelo art. 1º da Lei nº 14.549, de 21 de dezembro de 2011).
Estabelece ainda, em seu Art. 27, §7º: “A desafetação ou redução dos limites de uma unidade de conservação só poderá ser feita mediante lei específica, devendo para tanto ser precedida de estudos ambientais, análise jurídica e consultas públicas que justifiquem tal procedimento”. Restrição também estabelecida na Lei Nº 13.787/2009, Art. 19, §1º: “As Unidades de Conservação não poderão ser suprimidas ou reduzidas em suas áreas, nem utilizadas para fins diversos daqueles para os quais foram criadas, exceto através de Lei”. Como o empreendimento é de interesse do Estado, esta Lei será proposta e aprovada sem dúvida.
O empreendimento se caracteriza como significativo impacto ambiental através da Lei Estadual Nº 11.206/1995 que define a Política Florestal do Estado de Pernambuco e estabelece, em seu Art. 15, que “a cobertura vegetal remanescente da Mata Atlântica fica sujeita à proteção estabelecida em Lei”.
Portanto, a construção da Nova Escola de Sargentos terá obrigatoriamente que passar por avaliação e aprovação de EIA-RIMA específico acompanhado de Lei Estadual autorizando o desmatamento.
Como se trata de um empreendimento de interesse do Estado, não devemos duvidar que os procedimentos burocráticos sejam conduzidos e a obra liberada, já que a legislação tem brechas que permitirão a instalação do empreendimento. A pergunta seria: qual o benefício que a Escola traz para Aldeia/Município? Aumento da população? Mais público para consumir no comércio local? Aldeia está preparada para o aumento da população que se espera com o grande número de condomínios novos que estão sendo instalados mais o funcionamento da Nova Escola?
Hoje nossa estrada não suporta o fluxo já instalado. Não temos fornecimento de água, obtida por poços já super explorados inclusive com o grande número de grandes e pequenas empresas que exploram as águas subterrâneas. Não temos sistema coletor e de tratamento de esgoto, lançado de diferentes formas no solo com risco de contaminação da água que retiramos para nosso consumo e dos clientes das empresas exploradoras dessas águas.
Nós estamos eliminando a mata e o clima maravilhoso que tínhamos há 10 ou 5 anos. Acabando com as lindas neblinas das madrugadas e o ambiente sempre fresco apesar do sol. Agora estamos colocando em risco nossa água. Sem falar na fluidez do trânsito. Basta tentar entrar ou sair do fluxo da PE-027 e perceber o tempo que gastamos para pequenos deslocamentos.
A legislação prevê a compensação ambiental pelos impactos que não podem ser evitados. A meu ver é neste caminho que devemos lutar. Quais os benefícios, de fato, o empreendimento pode trazer?
O Decreto Federal 5.975/2006 deixa clara a exigência da reposição florestal no Art. 10: “A exploração de florestas e formações sucessoras que implique a supressão a corte raso de vegetação arbórea natural somente será permitida mediante autorização de supressão para o uso alternativo do solo expedida pelo órgão competente, devendo indicar o local da reposição florestal”. No Art. 19, especifica que “o plantio de florestas com espécies nativas em áreas de preservação permanente e de reserva legal degradadas poderá ser utilizado para a geração de crédito de reposição florestal”.
Tanto a Nova Escola como os novos condomínios não têm que assegurar somente a Reserva Legal, mas têm que compensar cada árvore derrubada com o plantio de novos indivíduos por compensação. Em um procedimento que fiz junto à CPRH para retirada de quatro árvores nativas e uma exótica de um terreno de uma amiga, durante a visita de inspeção realizada por técnicos da CPRH foi solicitada a reposição de 10 (dez) indivíduos arbóreos nativos para cada árvore a ser erradicada. É isso que está sendo exigido nos novos empreendimentos? Os 150 hectares a serem desmatados na Escola serão compensados com plantio de, no mínimo igual área ou número de árvores a serem erradicadas? Onde será feita essa compensação? Para proteger nossa flora, fauna e clima, obrigatoriamente dentro da própria APA.
O Art. 35 da Lei Estadual Nº 14.249/2010 assegura que, no caso de licenciamento ambiental de empreendimentos de significativo impacto ambiental, “o empreendedor é obrigado a apoiar a implantação e manutenção de unidade de conservação do Grupo de Proteção Integral, de acordo com o disposto na Lei n° 13.787, de 8 de junho de 2009, e no seu Regulamento”. Acrescido o benefício para a APA Aldeia-Beberibe no capítulo que trata da compensação ambiental (Art. 47, § 6º) assegurando que este apoio pode, “em virtude do interesse público, ser cumprida em unidades de conservação de posse e domínio públicos do grupo de Uso Sustentável”. (Acrescido pelo art. 1º da Lei nº 17.114, de 30 de novembro de 2020).
Neste sentido, além da aplicação do recurso financeiro da Compensação Ambiental que deve ser assegurada para a proteção da APA, a Política Florestal do Estado de Pernambuco, em seu Art. 8º, §2º, diz que a supressão da vegetação deverá, preferencialmente, ser compensada com a preservação ou recuperação de ecossistema semelhante, sendo no mínimo correspondente à área degradada, e que garanta a evolução e a ocorrência dos processos ecológicos, anteriormente à conclusão da obra. (Redação do parágrafo dada pela Lei Nº 15.652/2015). E, no Art. 55, que a reposição florestal é “obrigatória para pessoa física ou jurídica que explore, utilize, transforme ou consuma matéria florestal”.
O reflorestamento de áreas degradadas dentro da APA e a construção da Estrada Parque tão sonhada para Aldeia precisam entrar na negociação da compensação dessas obras que vêm comprometer um ambiente já pressionado pelo crescimento urbano.
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