Ali pela década de 1950, para não ir mais longe, Aldeia não passava de uma alternativa de vida sossegada para as classes mais favorecidas de um Recife que se expandia. Havia outras, para o norte e para o sul, e comprar uma granja na rota que levava ao quartel do Exército (no km 23 da Estrada de Aldeia, a atual rodovia PE-27) já era sonho de quem preferia morar ou apenas passar os fins de semana em paz e em harmonia com a natureza. Sim, já era…
Uns trinta anos mais tarde, no segundo semestre de 1979, conseguimos, afinal, morar por aqui. O Loteamento Canaã acabava de ser lançado, no km 7 (bem em frente à nascente Escola Internacional de Aldeia, do inesquecível amigo John Fryer), e um financiamento do Banco Nacional de Habitação (BNH) nos permitiu a compra de uma casa ali perto.
De lá para cá – são quatro décadas –, os não tantos que testemunharam tantas mudanças ocorridas no lugar hoje avaliam os prós e os contras do que se denomina progresso (com ou sem aspas, a critério de cada um).
Fato é que, há quarenta anos, o mais próximo posto de gasolina ficava lá em baixo, na PE-5, e não havia supermercados, centros de alimentação, academias de ginástica, ruidosas “casas de festejos” – isso tudo que hoje prolifera por aqui. A estrada, ainda sem iluminação, era tranquila, deserta…
Aos poucos, embora em progressão geométrica (o que é compreensível, nestes tempos estranhíssimos em que a humanidade caminha), o cenário do lugar foi se modificando. O inchaço do Recife repercutiu em Aldeia, e, à medida que levas de condomínios iam picotando as terras, a população local disparou. Não somente de pessoas de mais posses, como também (e, por isso mesmo) de outras em busca de trabalho – de simples serviçais a pequenos empreendedores, muitos destes bem-sucedidos.
Diz-se por aqui, sobretudo entre os “antigos”, que grande número daqueles que se mudam para Aldeia transporta para cá a mentalidade dos que se habituaram a viver empilhados em apartamentos, sem a compreensão de que este lugar seria (seria?) um refúgio para se escapar da balbúrdia da metrópole.
Como quer que seja, os tempos sempre mudaram e as consciências, também. O progresso que nos avassala talvez não seja detido, mas pode ser controlado. E, como os poderes públicos têm sido inúteis – para não dizer corrompidos –, algumas organizações de cidadãos, como o Fórum Socioambiental de Aldeia, vêm lutando pela preservação do lugar.
Nenhuma delas, creio, pretende deter a transformação da humanidade – goste-se do que aí está ou não. O que assusta é a forma desorganizada de se fazerem as mudanças neste lugar, que vem sendo destroçado há décadas tanto pela estupidez do poder público quanto pela inconsciência dos moradores, doutores e garis.
Muitos dos que conhecemos a outra Aldeia de não-faz-tanto-tempo-assim ainda nos preocupamos em preservar o que ainda resta de verde, de água, de paz, de silêncio, de fraternidade, de harmonia. Do que sobrou daquela Aldeia que já era… já era… sonhada por tantos.
* Antonio Portela é jornalista e mora em Aldeia desde 1979.
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