Numa reunião com amigas estava eu, bem feliz após preparar “o mocinho”, que pouco trabalho deu a ficar pronto. Logo ele estaria redondinho, cheiroso, esfumaçante e amarelinho, à mesa, para degustação acompanhado por um café delicioso. A primeira colherada, o primeiro sorriso, acompanhado de uma tentativa de dizer alguma coisa do assunto em que todas estavam, compartilhando divertidamente, veio um vulcão de farelos e tosses seguidas: sufoquei. Batidas nas costas a braços levantados, “respira, respira”, manobras caseiras aplicadas por quem presencia uma cena dessas, no mínimo apavorante. Mas deu tudo certo. De mocinho a vilão, o meu amigo cuscuz deu-me um susto, mesmo com os mais avisados conhecimentos que guardo dentro da profissão.
Penso, então, nos mais velhos, os idosos, cuja musculatura já se encontra cansada e em desgaste natural pelo tempo de uso, dessa máquina que é o nosso corpo. Penso em quantos já passaram por situações assim, por falta de conhecimentos, de orientação, e que até foram parar num quarto de hospital com quadros de bronco-aspiração e pneumonia consequente.
O cuscuz aqui no Nordeste é uma iguaria, um prato típico regional bastante admirado e deliciado, mas complicado no contexto do envelhecimento, em quadros de Acidente Vascular Encefálico (AVE), demências senis. De nome estranho, a “disfagia” é um sintoma relacionado a qualquer alteração no ato de engolir que impeça a ingestão adequada do alimento; é uma dificuldade de engolir, muitas vezes não evidente a olhos desavisados, porém de graus variados: de leve a severa. Pode acarretar, como consequência, uma pneumonia aspirativa (a que se origina da aspiração do que é deglutido) levando à internação ou até ao óbito.
O idoso, nesse sentido, necessita ser orientado quanto à qualidade de sua dieta e a exercícios direcionados à disfagia, quase sempre presente nessa fase da vida. O fonoaudiólogo é o orientador adequado nessas situações, ajudando a prolongar a vida de pessoas tão queridas e importantes para nós.
Nessa, como em tantas outras situações, o fonoaudiólogo(a) é o profissional que irá ter uma leitura clínica e, muitas vezes, ajudar a prevenir riscos imperceptíveis, em situações corriqueiras, que já andam acometendo a vida do idoso. Juntamente com a família, poderá entender as necessidades em relação à adequação da dieta do idoso, ajudando a indicar um nutricionista ou nutrólogo; a entender a dinâmica de comunicação, por vezes limitada, e ajudar a redimensionar a importância de incluir esse idoso nas conversas diárias da família, quiçá orientando o uso de um aparelho auditivo ou sobre uma leitura labial facilitada, por parte do parente, para que ele possa aproximar-se mais, falando em intensidade mediana, mas articulando melhor ou mexendo mais os lábios; enfim, são movimentos avaliativos de extrema importância, cuidados relativos à área da fonoaudiologia que poderão salvar vidas queridas
Ana Paula Ponce Lucena é aldeiense, fonoaudióloga, além de psicanalista e psicóloga em formação.
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