Se no dia 1º de janeiro de 2020 alguém tivesse me questionado sobre os meus pedidos enquanto pulava as sete ondinhas na praia de Boa Viagem, posso tranquilizá-los, que assim como a maioria da população planetária, eu humildemente só pedi, “paz, amor, saúde e prosperidade”. O ano mal começou e não deu nem tempo de ver os meus, os nossos pedidos se realizarem. Fomos atingidos em cheio por um enorme problema chamado Covid-19. De repente, mudanças comportamentais passaram a ditar regras na convivência. Não se tratava de algo isolado, mas de uma abrangência mundial.
Anos dedicados à educação e eu nunca antes tinha visto escolas decretarem férias, com apenas 27 dias do ano letivo. Sonho transformado em realidade para aqueles que defendem a existência de mais “domingos” e menos segunda-feiras. Mas trancados dentro de casa? Não mesmo!
#fiqueemcasa tornou-se a expressão mais usada em todas as mensagens das redes sociais.
Sim, de fato cumprir a quarentena ou o isolamento social, tem sido a maneira mais eficaz para o controle da doença. Divide opiniões, por certo, mas não é meu objetivo entrar nesse mérito.
Já no meu segundo dia de confinamento, desliguei-me dos noticiários e decidi que precisava fazer algo que há bastante tempo tinha vontade.
Quem me conhece sabe que sou ligada nos 220 volts. Amo ser professora. Ajudar um ser a se desenvolver e contribuir na sua formação humana é para poucos. Eu sei disso e sou muito orgulhosa da profissão que escolhi. Mas tenho outra paixão na vida, a ARTE! E essa tenho a certeza: que foi ela que me escolheu. Por isso componho, dramatizo, invento personagens, crio, conto histórias, canto e brinco. Esta sou eu! Sandra Moraes. Quando não estou fazendo Sandrices, estou contando histórias. Este é o meu “canto”!
Motivada pela fala do meu gestor Mike Fryer, numa reunião antes do isolamento – disse ele: “na crise, tire o s” – decidi dar uma guinada na minha vida, para não pirar. Reuni meus dois filhos, 3 celulares, um computador (lentinho), um canto de estudo que virou estúdio improvisado, muitas ideias na cachola e um desejo enorme de me REINVENTAR. Fazer diferente, errar e aprender. Me desafiar e me divertir muito.
A solução encontrada foi fazer uso das ferramentas e plataformas digitais. Passei a fazer “lives” para me conectar com pessoas, mas sobretudo diminuir um pouquinho da saudade dos meus alunos. Nossa, quando eu os vejo pela tela, meu coração é uma explosão de sentimentos! Minha vontade é de apertar, abraçar, fazer cafuné (só quem é meu aluno vai entender) e mandar muitas beijocas sabor pipocas. Agindo desse modo, tirei minha ideia do papel e coloquei numa timeline!
Ah, já ia esquecendo: criei um canal no YouTube e hoje faço parte de um grupo de contadores de histórias do Brasil todo, o projeto “Vamos te contar”, além do já conhecido LeriCantar, em parceria com Anderson Augusto, o querido Tio Som.
Não poderia encerrar esta conversa sem fazer um breve reconto de uma fábula japonesa que diz:
“Morava numa aldeia uma mestra em origami chamada Daishinji. Muito talentosa, certa vez fez uma dobradura perfeita de um peixe usando uma simples folha de papel. Orgulhosa pelo belíssimo trabalho, o recolheu dentro de uma caixa, temendo a cobiça alheia. Este, por sua vez, ali trancado, se achava muito solitário. Pediu-lhe um habitat e companheiros marinhos. Habilidosa e criativa, prontamente atendeu seus pedidos. Usando apenas papel, graciosamente das suas dobraduras fez surgir um oceano e muitas espécies marinhas, para o seu perfeito peixe de papel.
Tempos depois, o peixe de papel lhe suplica pela liberdade e deseja viver em um oceano de verdade para conhecer a sensação das profundezas do mar e assim desvendar os seus mistérios. A mestra negou, pois aquilo era um absurdo. Tinha-o guardado por tanto tempo, como ousava tal pedido! Acabou cedendo, embora relutante, pois guardava consigo a convicção de que “coisas imaginárias têm de permanecer no imaginário”. Pegou o peixe e o colocou na água. Para sua surpresa, ele não se desfez, ganhou vida! O peixe de papel aprendeu a nadar!”.
Moral da história: ‘Se sua ideia é suficientemente autêntica e criativa, ela não sobreviverá por muito tempo no papel. Ela almeja a liberdade! Quer ser lançada para fora. Ganhar vida, cor, sabor… E de preferência, que seja você o responsável por esta iniciativa. Caso contrário, outra pessoa o fará’.
Sandra Moraes é pedagoga, especialista em Prática e Gestão do Ensino. Atua como professora na Escola Internacional de Aldeia . Também é contadora de Histórias, roteirista e criadora de suas ‘Sandrices.
Cadastre-se para receber nossa newsletter.