O futuro começa ontem. Quem sabe essa troca de adjetivo temporal ajude a entender o óbvio: é preciso preservar a natureza do modelo de desenvolvimento predador. O aquecimento global não começou agora. Ele ocorre desde antes de Greta* nascer. E para a nossa esperança, ela faz parte da evolução genética que não aceita (nem passa pano para) as absurdas decisões políticas do crescimento dos países pautado na acumulação de riqueza dos grandes grupos econômicos. Nesta quinta-feira, 27 de maio, foi celebrado o Dia Nacional da Mata Atlântica e você já parou para pensar em como esse bioma tão cheio de vida alimenta a humanidade?
Em 27 de maio de 1560, o Padre Anchieta descreveu, por primeira vez, na famosa Carta de São Vicente, as belezas tropicais das florestas brasileiras. Mas foi em 1999 que o dia 27 de maio se tornou o Dia Nacional da Mata Atlântica. Não é uma homenagem à Carta, mas, sim, um chamado urgente de cuidado com este bioma que se estende por todo o litoral brasileiro.
Mas a ganância e a insanidade do lucro destruíram muito a Mata Atlântica. Esta área se tornou o lar de 72% da população do Brasil e concentra 70% do PIB. Hoje o bioma tem apenas 12,4% da sua vegetação original, espalhadas em 1,3 milhão de quilômetros quadrados, o que seria três vezes o território da Suécia. Por isso, nossa missão é preservar o que restou e regenerar o espaço entre os fragmentos, onde for possível. Sim, onde for possível. Segundo relatório da ONG do SOS Mata Atlântica, 80% dos fragmentos estão em propriedades privadas. O que não dá o direito de destruição, mas dificulta a ação de proteção.
A Área de Proteção Ambiental Aldeia-Beberibe, em Pernambuco, é um bom exemplo disso. Além de condomínios construídos na base do desmatamento, hoje o Governo de Pernambuco tenta passar uma licitação para construir um arco metropolitano no meio da floresta. Em que mundo estamos? Será mesmo que essas práticas políticas acreditam em planeta B? Basta! Esse arco é insano. Ele precisa arrudiar e ir por lá, mais perto de outros municípios, o que pode atrair investimentos econômicos numa área que precisa de apoio para implantar negócios de impacto, por favor, positivo para o meio ambiente e as pessoas.
O debate sobre o aquecimento global tem ampliado nossa visão sobre justiça social. Mitigar as mudanças climáticas, que ficam ali no debate de cúpula sobre o NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada), tem a ver com preservar as florestas para diminuir a emissão de gás carbônico e a leveza do ar que respiramos. Mas também se relaciona com a retenção das águas que alimentam os lençóis freáticos, os quais abastecem as cidades.
Somos a favor do desenvolvimento. Mas o modelo precisa mudar. O extrativismo, as queimadas e as grandes áreas de monocultura que empobrecem a terra precisam dar lugar à humanidade entre nós. Cuidar dos biomas é evitar deslizamento de barreiras e encontrar lugares para moradias seguras e agradáveis. É adotar sistemas de transporte de energia limpa, renovável e não motorizada. Imagina só percorrer a Região Metropolitana do Recife de barco, bicicleta, patins e ônibus – sentada, por favor, e se for em pé é para observar a vista, o povo na rua, o sorriso da criança na calçada. É implementar a agroecologia na cidade para compartilhar o pão com mais gente, garantindo segurança e nutrição alimentar. É investir na geração de trabalhos conectados com o acesso ao conhecimento, à ocupação dos espaços públicos, ao bem viver coletivo. Preservar a Mata Atlântica, onde boa parte da população mora, é dar lugar à vida.
*Greta Thunberg, 18 anos, é uma ativista ambiental sueca criadora do Movimento Sextas sem Aula pelo Clima. Bastante influente no mundo todo, ela chegou a ser cotada a receber o Prêmio Nobel da Paz.
Sylvia Siqueira Campos é diretora executiva de Nuestra América Verde
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