Em épocas ainda não muito distantes da nossa contemporaneidade, os homens e mulheres que desejavam deixar o registro de sua existência para a posteridade buscavam incentivar a arte patrocinando artistas como Aleijadinho ou Michelangelo, ou custear a construção de templos religiosos, ou ainda doar áreas de sua propriedade para a edificação de prédios de interesse público como conventos, escolas ou hospitais.
Uma rápida visita a nossas cidades históricas como Olinda, Salvador e Ouro Preto, revelam e comprovam o quanto esta prática foi usual, e justifica o interesse dos cidadãos mais abastados em registrar em “pedra e cal” um marco de seu poder e influência econômica, e de certo modo angariar para si o título de Comendador, Mecenas, ou obter reconhecimento como cidadão benemérito.
Eventualmente estes cidadãos eram também incentivados pela igreja a obter as indulgências (do latim indulgentia, que provém de indulgeo, “para ser gentil”), ou seja, a remissão, total ou parcial, da pena temporal devida, para a justiça de Deus, pelos pecados que foram perdoados, ou seja, do mal causado como consequência do pecado.
Na sociedade brasileira atual, tão carente de exemplos de cidadania e de demonstrações de atitudes que favoreçam ao bem comum, a criação da legislação relativa às Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) assume este papel de demonstração de uma atitude do cidadão que pensa e age para além da nossa interinidade enquanto seres finitos e de existência efêmera.
Do ponto de vista legal, este instrumento foi criado pelo Decreto Nº 5.746 de abril de 2006, e se apoia na Lei Federal Nº 9.985, de julho de 2000, que criou o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). Aqui em Pernambuco, quem possui o poder de constituir as RPPNs é a Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH), que o faz respaldada na Lei Nº 13.787 de junho de 2009.
A RPPN é uma categoria de unidade de conservação criada pela vontade do proprietário rural, ou seja, sem desapropriação de terra. No momento em que decide criar uma RPPN, o proprietário assume o compromisso com a conservação da natureza, e ele o faz de modo perpétuo, pois mesmo que depois possa vender a área, ela continuará protegida, e, caso o novo proprietário resolva desconsiderar esta exigência, incorrerá em crime ambiental.
Como benefício de contrapartida, após a criação da RPPN, o proprietário obtém a isenção do pagamento de impostos territoriais, como ITR ou IPTU, e poderá captar recursos para Projetos de Conservação Ambiental, com prioridade sobre outras áreas distintas.
Além de preservar belezas cênicas e ambientes históricos, as RPPNs assumem, cada vez mais, objetivos de proteção de recursos hídricos, manejo de recursos naturais, desenvolvimento de pesquisas científicas, e manutenção de equilíbrios climáticos e ecológicos. Em uma RPPN poderão ser desenvolvidas atividades recreativas, turísticas e de educação e pesquisa, desde que sejam autorizadas pelo órgão ambiental responsável pelo seu reconhecimento.
Quando destacamos esta atitude como uma ação benemérita, nos referimos ao fato de que quem resolve conservar uma área de mata em torno de uma nascente de um rio, não o faz apenas para si ou seus familiares, e sim para todos que usufruirão no presente e no futuro deste bem fundamental à vida que é a água.
Do mesmo modo procede com a conservação da biodiversidade e todos os demais serviços ambientais como: melhoria da qualidade do ar, diminuição das ilhas de calor, impedimento de erosão, melhoramento do solo, absorção de água nos lençóis freáticos, manutenção do potencial agrícola do entorno, entre outros já tão bem estudados.
Portanto, se você, sua família, ou grupo de amigos deseja ser lembrado por muitos anos ainda como um exemplo de ser humano que se preocupa e age em defesa do ambiente natural, e assume o compromisso de preservar um bem comum, tome a atitude de criar uma RPPN.
Célio Muniz é morador de Aldeia desde 2006, consultor ambiental e diretor de Meio Ambiente da Prefeitura Municipal de Camaragibe.
Imagens: Pixabay
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