Os aldeienses Clara e Adam Phillips há muitos anos se preocupam em viver da forma mais sustentável e com o menor desperdício possível. Depois de um curso de permacultura, então, passaram a olhar o mundo com olhos de quem pode aproveitar (quase) tudo o que os outros descartam ou já não querem mais. Daí a construir sua própria casa, com as próprias mãos e utilizando materiais e técnicas ecológicas, foi um pulo.
E com os pés e mãos na massa de superadobe (mistura de barro e entulho de construção processado) foram 21 meses. Dias inteiros, de semana e fins de semana, 12 a 16 horas diárias de trabalho. Começando com um projeto que o próprio casal desenhou, algumas adaptações foram sendo feitas no caminho. “A gente pode sonhar livremente, mas na hora de concretizar, vemos que algumas adaptações têm que ser feitas”, resume Clara, que é professora da sala maker.
Os sacos de ráfia recheados de superadobe foram sendo empilhados como paredes em formato circular. “Circular porque assim a energia flui de uma forma diferente, mas com algumas quebras no círculo, para que essa energia não fique retida dentro da casa”, explica a professora, que também é um pouco mística.
Tudo na casa, batizada de Casa Urucum (por causa de um pé de urucum que o casal plantou e demorou a vingar, ficando como símbolo de força e resistência), tem uma história. Tem a história de Clara e Adam, que sonharam com a casa e mesmo depois de um mês morando nela ainda não acreditam que foram capazes de construí-la. Tem a história de amigos que ajudaram a pisar o barro e acompanharam o passo a passo física e virtualmente. E tem a história dos materiais coletados em ferro-velhos, nas ruas e em depósitos de demolição.
Uma das portas da casa, por exemplo, foi trazida de uma demolição, ainda com as anotações da vigilância sanitária anotadas no postigo. Adam conta que pretende lixar e pintar a porta, mas vai deixar o papel colado, “pois ali está a história de alguém”.
Na porta do banheiro, que tem como fechadura um parafuso e um gancho, e como maçaneta um pedaço de barra de ferro, os amigos são convidados a deixarem seu depoimento. Mais uma forma de “construir uma história” com o testemunho de quem pisar aquele chão.
Pás, enxadas, baldes e carrinho de mão foram companheiros de Clara e Adam durante o tempo em que construíram a casa. Eles contam que a exaustão física era diária, e muitas vezes tiveram que recorrer à massagem para recuperar os músculos cansados. “A gente também aprendeu a conhecer nosso corpo e saber quando estava chegando ao limite. Aí, como na fase de cobrir o telhado, por exemplo, a gente dava umas pausas e ia cuidar das plantas enquanto o corpo descansava um pouco”, diz Clara.
Fora o balcão da cozinha e a colocação das telhas na cobertura da casa, todo o resto foi feito pessoalmente pelo casal, o que incluiu o sistema de reaproveitamento de água, a instalação elétrica e a fossa séptica utilizando o sistema de evapotranspiração. As paredes ecológicas que eles levantaram enchendo saco a saco, têm 35cm de largura e mantêm a temperatura da casa agradável ao longo do ano. Além de um quarto de casal, banheiro, sala e terraço, eles construíram um mezanino onde fica o quarto de hóspedes.
Agora que estão instalados, embora ainda não considerem a casa terminada, estão na fase de contemplação. “A gente chega no fim do dia, se senta na varanda e fica curtindo o ambiente. Recentemente, junto com uma amiga ornitóloga, identificamos 35 espécies de aves sentados aqui em nosso terraço”, alegra-se ela. “Era tudo o que a gente queria: estar no meio dessa natureza, da qual fazemos parte, e o encontro com nossos amigos, que vêm nos visitar. Agora ela começa a se tornar uma casa de verdade”.
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