“Pensar é um ato. Sentir é um fato.”
Nunca experimentei sensação igual ao ler um livro. Claro que cada livro é cada livro, cada livro guarda um universo esperado a ser lido, mas você pode sentir de maneiras diferentes o mesmo. É doido como um livro pode nos prender a tal ponto que parece feitiçaria.
As palavras desse livro são pensamentos, pensamentos que ultrapassam as palavras correndo, correndo, não tem pausa, um atrás do outro. Faço desses pensamentos os meus; parece que nunca leio rápido o suficiente, as palavras estão sempre à minha frente. No começo, esse ritmo incessante de pensamentos me cansam; são demais para minha cabeça. Mas logo sou capturada pelo feitiço e – lá estou – não consigo parar de ler. Mudo de posição algumas vezes, mas nem assim tiro os olhos das páginas: somos eu e o livro, o livro e eu. O relógio tictacteia ao meu lado, mas mesmo me perguntando que horas são não desvio o olhar. Bato o pé na parede, não sei o que estou fazendo, só continuo sem poder parar. Sinto como se prendesse a respiração durante todo o livro, mas isto seria impossível, eu não viveria.
Os pensamentos continuam a fluir, as páginas voam… 42, 54, 60, 68, 70, 82… só existimos eu, Macabea e Rodrigo. Sinto a garganta seca, a barriga vazia doendo, mas talvez esteja olhando através de Macabea, em seu viver ralo, de somente viver, respirar, fora de si, fora do mundo.
É simplesmente incrível a forma como este livro foi escrito, sem floreios, sem enfeites, apenas a linguagem nua e crua, como é a realidade. Se lesse novamente este livro não sentiria o mesmo, porque essa magia só acontece uma vez; depois, já sabemos, o feitiço se quebrou, mas podemos ampliar esse mundo ainda com palavras e detalhes que perdemos da primeira vez, e as palavras podem ganhar novos significados, pelos novos olhares que vemos através do tempo, tempo este que não para de correr, como os pensamentos de Clarice, sempre buscando respostas e encontrando mais perguntas no lugar.
Este livro é um soco no estômago, como a vida o é, e também como a vida, carrega a beleza e a tristeza de ser, a dor e o prazer que significa ser humano. Ele serve para nos dar um pouco da empatia que falta no mundo, empatia de enxergar através dos olhos do outro; enxergar as pequenas grandezas existentes em cada um de nós, e entender que todos somos humanos… olhar para uma parte e ver o todo, entender que todos nós chegamos a este mundo dando o primeiro parco inspiro, e que todos vamos um dia deixá-lo, em um último parco sopro.
Flora Bittencourt
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