Na antiga história grega, felicidade era definida como um estado de alma, onde a realidade menos as expectativas era o que lhe definia, da melhor forma.
A felicidade era considerada a máxima virtude, mas algo não permanente, era viver a vida em harmonia e não no sentido intenso. Nesta perspectiva, felicidade não era estar sempre apaixonado nas relações, nem estar livre de tristezas e adversidades.
Atualmente, vivemos algo inédito nas nossas casas, comunidades e no mundo, somos obrigados a nos colocar segregados em espaços restritos, e nos percebemos compelidos ao uso intensivo da comunicação virtual, pela impossibilidade segura da convivência física com os nossos semelhantes, sentindo-nos, com isso, solitários e infelizes.
A solidão, sem remédio, torna-se um desespero e alimento da infelicidade e do medo. Somos obrigados a nos despojar do que temos de mais precioso, o convívio e afetividade natural, de quem amamos e com quem nos sentimos bem.
Nesse sentido, a Covid -19 é mais do que uma advertência e uma reflexão, nos coloca frente a frente com fantasmas que já existiam, mas não eram percebidos pelo nosso cotidiano agitado, cegueira para com as intolerâncias, injustiças sociais, desrespeito ao meio ambiente… Isso tudo agora revela-se e passa a ser amplificado, afetando, dramaticamente, o nosso cotidiano, tenhamos bens materiais ou não, tenhamos poder, ou não. Passa a ser percebido por todos, basta ter ouvidos para ouvir, olhos para enxergar e alma para sentir.
Os desgastes físicos e mentais passam a ser insuportáveis: fome, medos, solidão, notícias de mortes, informações de prognósticos nefastos e irremediáveis vão nos levando ao agravo das sensações de pânico e angústia. Surgem taquicardias, dores, apatia, medos, intolerâncias…, busca de ajuda terapêutica; mas o terapeuta também tem família, medos e está em isolamento social. “Estou só!!!!!”. O que fazer?
Segundo um pensador indiano, Osho, “A capacidade de estar sozinho é a capacidade de amar, e isso pode parecer paradoxal a você, mas não é. Essa é uma verdade existencial. Solidão é ausência do outro e solitude é sua própria presença”. Para este pensador indiano, viver a solitude permite ao outro a liberdade absoluta, pois saber que se o outro for embora, eles serão tão felizes como são na sua companhia, isso seria libertador e traria felicidade.
Segundo Osho, a felicidade de cada ser não pode ser tirada pela falta do outro, porque não foi dada pelo outro, somente pessoas que são capazes de estar a sós, são capazes de amar, de compartilhar, de ir no mais profundo âmago da outra pessoa, sem possuí-la, sem se tornar dependente do outro, reduzindo o outro a uma “coisa”, e sem ficar viciado no outro.
Seria este o momento de experimentarmos a solitude, decantada por Osho, como forma de alívio das nossas angústias e medos? Não sei. Além dessa possibilidade de experienciar, na prática, a solitude, este é um momento único nas nossas vidas, e pode ser muito bem aproveitado para nosso crescimento como “seres humanos”.
Acredito que nas situações de emergência, como essa que ora experimentamos, em que o direito à vida, ao alimento, até mesmo ao oxigênio, por falta de equipamento médico, é uma realidade, é fundamental o afastamento do ego, da ideologia partidária egoísta, e olharmos mais para o nosso entorno e para o que nos cabe fazer.
O socorro imediato às vítimas mais vulneráveis da nossa sociedade deve ser nossa prioridade, nos valendo do que temos, além do necessário. Olhar para o lado, apoiar os nossos familiares, amigos, funcionários, auxiliares, vizinhos, conhecidos que estiverem em situação de vulnerabilidade, deve ser uma prioridade.
Este pode ser o primeiro passo na busca da nossa reorganização interna, na busca da felicidade; depois, ao final dessa crise aguda, podemos nos preocupar em refletir sobre a importância da solitude de Osho, da valorização dos serviços públicos essenciais, da pesquisa científica, da educação pública universal, das políticas públicas de redução da desigualdade social, da proteção ao meio ambiente, e com isso nos integrarmos, harmonicamente, a estes grandes organismos vivos, a Humanidade e o Planeta Terra, estabelecendo um ambiente desfavorável a novas “Covid-19” e favorável ao nosso crescimento interior e felicidade.
Leonardo de Paiva é PhD em Medicina Taoísta, pela International Institute of Being Tao, fisioterapeuta, educador físico e fundador da Universidade Aberta do Terapeuta (Unate).
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